segunda-feira, 24 de março de 2014

Espera de quase 30 anos: veja os extremos da fila dos precatórios no RS

Série de reportagens detalha dívida do Estado, que supera R$ 6 bilhões

Vera Sanfelice, 74 anos, espera receber cerca de R$ 4 milhões devidos ao marido, que morreu em 1999
Foto: Eduardo Matos/Rádio Gaúcha

Por traz dos números da extensa fila de credores, há pessoas aguardando há décadas pelo que têm direito. Em quatro reportagens, a Rádio Gaúcha detalha essa disputa judicial onde só há perdedores. De um lado o credor, que ganha, mas não recebe. De outro, o Estado, que perde, mas não paga. Na primeira reportagem, os extremos dessa fila.
A empresa “74.634” possui o precatório mais alto devido pelo Estado do Rio Grande do Sul. São R$ 74.680.124, 33. Pela ordem cronológica de pagamentos, consideradas as preferências legais, o primeiro da fila já morreu. É o senhor “12.661”. Desde 1999 aguarda receber cerca de R$ 4 milhões. O precatório mais antigo atualmente é da empresa “3.565”. Desde 1987, aguarda receber R$ 28.561.034, 27. Já o precatório mais novo, incluído no orçamento de 2014, é do senhor “107.378”. São R$ 759.688,06 a receber do Estado.
Essa é justamente a principal reclamação dos credores do Estado. A de serem tratados apenas como seus lugares da longa fila de precatórios.
Incobrasa, dona do precatório mais alto devido pelo Estado, não opera mais no Rio Grande do Sul desde a década de 1990. Transferiu a unidade de moagem de soja que funcionava em Canoas para Illinois, nos Estados Unidos. Venceu uma ação judicial contra o Estado que discutia o pagamento de ICMS de produtos semielaborados e industrializados. O advogado da empresa, Adroaldo Furtado Fabrício, não poupa críticas aos governos estaduais.
"Eu acho profundamente lamentável. Em primeiro lugar, ao Estado cabe dar exemplo de conduta para o cidadão. E se o exemplo que o Estado dá é de calotear os seus débitos, é evidente que haverá quem se sinta a fazer o mesmo", afirma Fabrício.
O advogado admite e lamenta que com o cenário atual seu cliente nunca vai receber os mais de R$ 74 milhões.
“A única esperança que se pode ter é de que, em algum momento, o governo federal venha a compreender que essa é uma situação completamente lamentável e venha a encampar ou criar algum mecanismo que permita o pagamento desses créditos. Senão no valor total, pelo menos parcial”, sugere o advogado.
Vera Sanfelice, 74 anos, é viúva de Jocely Victor Sanfelice. O ex-procurador do extinto Departamento Estadual de Portos, Rios e Canais morreu em 1999. Ele aguardava receber cerca de R$ 4 milhões. Em função da idade, Dona Vera é a primeira da fila, consideradas as preferências legais.
“É muito desorganizado. O Estado tem dinheiro para tudo, mas para isso nunca tem”, reclama Vera.
Dona Vera tem na ponta da língua o que faria com o dinheiro, se recebesse é claro. “Eu daria uma boa arrumação na minha casa”, sonha a aposentada.
O Moinhos de Trigo Indígena possui o precatório mais antigo do Estado. Cadastrado em 1987, supera os R$ 28 milhões. É o primeiro da fila, mas sem qualquer perspectiva de receber em razão do alto valor. Já o último da extensa fila de precatórios é o de Alberto Demari, 77 anos. O agricultor viu o Estado avançar sobre suas terras na construção de parte da Rota do Sol na década de 1980. Com o sotaque típico dos imigrantes italianos, diz que está doente, que ainda precisa trabalhar na lavoura e que o dinheiro ajudaria e muito no sustento.
“Pago R$ 800 por mês de Unimed para poder sobreviver. Porque cada mês preciso ir ao médico. Fui operado do coração. Tenho que me cuidar. Recém saí da lavoura, colhendo uva. Se eu não trabalhar, quem é que paga o meu sustento?”, questiona o agricultor.
Fonte: Rádio Gaúcha

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